Problemas de Expressão: 2007-01-21

Problemas de Expressão

Blog anónimo, preenchido com pensamentos, nem sempre inteligentes, mas genuínos. Os que eu não escrevo, são emprestados. Alguns posts tendem para a perversidade, mas só se estiver muito inspirada...

sábado, janeiro 27, 2007

Deixei de gostar



Deixei de gostar de ti. Cada dia que passa, a certeza disso aumenta em mim.
Já não sinto paixão, nem amor, nem carinho. Também não sinto ódio nem raiva. Apenas me resta um vazio que me dói intensamente.
Não consigo lidar com as tuas demonstrações de afecto, já não sinto prazer ou felicidade quando me tocas ou beijas. Nessas alturas, sinto um enorme desespero porque já não desejo as tuas carícias. Gostava que deixasses de me beijar diariamente quando chegas ou vais e que agisses de forma indiferente, tal como o venho a fazer desde há algum tempo. Não consigo fazer-te entender que esses gestos já deixaram de ter significado para mim. Não suporto mais esta situação.
Tenho pensado muitas vezes na fragilidade da nossa relação. Não é uma situação recente, muito pelo contrário, é um acumular de pequenas e grandes coisas que resultaram neste desenlace.
Tudo isto começou há muito tempo, por culpa de ambos. Talvez por pensarmos que todas as diferenças são superáveis quando duas pessoas pretendem fazer uma vida conjunta. Nem todas as diferenças são superáveis.
No nosso caso, existem dois grandes fossos: a forma como vivemos / queremos viver a vida e a forma como entendemos e vivemos o amor e as relações humanas. Neste último fosso enquadro a nossa visão de família, que é tão distinta. Enquadro também o campo dos afectos e das energias que unem as pessoas.
A minha ideia de família tem como ponto chave o diálogo, o apoio emocional. As pessoas de uma família discutem, ouvem-se, aconselham-se, reflectem sobre as divergências, constróem planos de futuro. Partilham os defeitos e as virtudes e sobretudo aceitam-se como são, porque já assim eram desde o início e porque, na verdade, a essência de uma pessoa não muda jamais.
Nem eu nem tu podemos ser quem não somos. Podemos tentar por uns tempos para agradar ao outro, para iludi-lo, mas nunca se muda verdadeiramente. Esta verdade foi uma enorme falha na nossa relação. Neste momento, procuro-me e não me encontro. Não sou quem realmente sou nem sou quem gostavas que fosse. Nem eu mesma consigo gostar de mim assim. Como podes tu gostar?
A minha essência quer voltar a revelar-se e tem vindo a escapar-se aos poucos de dentro de mim, por muito que a tente conter. E cá estou eu. Sem qualquer castração.
Sou egoísta. Gosto e sempre gostei de ter o meu espaço, onde posso viver a minha solidão e onde me encontro. Preciso de ler, escrever, cantar, dormir, sonhar, chorar, sem ser incomodada. Perdi esse espaço há imenso tempo.
Gosto de satisfazer pequenos prazeres que me fazem sentir bem. Porque não falar com uma amiga durante meia hora ao telefone, ou sair e conversar com alguém que já não encontro há muito tempo, restabelecer antigas amizades, visitar familiares, comprar o livro ou a roupa pela qual me apaixonei? Porque não ir ao restaurante independentemente da época do ano, mesmo sabendo que vou ser mal atendida, se assim o desejo? Porque não ir tomar café a seguir à refeição, nem que seja pelo facto de ver pessoas e encontrar-me no meio delas, mesmo não as conhecendo? Porque não ficar até tarde na praia e esquecer-me dos horários se o posso fazer e me apetece tomar mais um banho ou conversar mais um pouco com os amigos? Porque não ficar mais umas horas na cama ao fim-de-semana, se o corpo pede e nada me obriga a sair de lá?
Sou obstinada. Se posso concretizar uma ideia viável na minha cabeça, porque contrariá-la? Porquê ser vencida mas não convencida?
Sou muito insegura. Sinto muitas vezes falta de confiança em mim própria e desisto facilmente. Preciso de ouvir vezes sem conta uma palavra de apoio para ir em frente.
Sou impulsiva e tomo decisões precipitadas, por vezes, sem reflectir.
Sou emotiva, sentindo a felicidade e o desespero em graus extremos. Nesses momentos preciso de dar e receber atenção, um sorriso e muitos mimos.
Tenho imensos defeitos que não consigo alterar, inerentes a mim mesma, que me conferem um pouco do charme de ser quem sou:
Não sou poupada. Sei que gasto dinheiro em coisas supérfluas que me dão prazer.
Não sei nada de planos de poupança, IVA, IRS, taxas de juro.
Não sei pedir descontos.
Não sei regatear.
Não gosto de regatear.
Não comparo preços para conhecer a melhor relação qualidade/ preço.
Não tenho gostos por marcas de roupa, carros, telemóveis, computadores, televisões. Gosto de comprar aquilo que me atrai e apaixona à primeira vista, independentemente do que seja.
Não sou pontual.
Não sou organizada. Nem arrumada.
Não ando num carro impecavelmente limpo e cheiroso.
Confio sempre nos outros, mesmo que não os conheça bem.
Sou desorientada e distraída.
Acho que sou o centro do universo.
Mas também tenho qualidades que relego sempre para segundo plano. Por vezes até me esqueço delas:
Sou muito afectiva. Dou tempo, beijos, mimos, carícias, atenção. Tudo isto brota intensamente de dentro de mim e sinto necessidade de canalizar para as pessoas a quem me sinto ligada. Não posso reprimir os sentimentos bons ou ficar indiferente quando começam a fluir. Preciso de tocar, conversar, sorrir , beijar, abraçar as pessoas que estimo.
Gosto de ajudar seja quem for, pessoa ou animal. Se precisarem de mim, estou presente, mesmo que isso implique abdicar de um prazer pessoal. Fico feliz com a felicidade dos outros e raramente sinto inveja.
Sou trabalhadora e responsável. Dou de mim o impossível para que as coisas corram bem. Adoro coisas novas, projectos, desafios, criar, construir. Acredito que tornarei a recuperar a minha capacidade criativa, que está esquecida mas que pede intensamente que a desenvolva.
Essa sou eu.
Tu também não consegues representar bem um papel para o qual não foste feito. E se o tens tentado, nos últimos tempos, na esperança ilusória de que tudo possa vir a ser melhor do que foi, enganas-te. Mais uma vez te digo que a essência das pessoas não se altera, lamento.
Nem sempre me dás a atenção de que eu preciso.
Nem sempre me tratas como se eu fosse o centro do mundo. Eu sei que não sou, mas faz-me sentir bem sê-lo para alguém.
O que eu gostava realmente que houvesse em ti?
Mais disponibilidade emocional,
mais interesse pelo que te rodeia,
mais afectos, mais palavras, mais elogios,
mais companheirismo,
mais actividade e mais luta,
mais partilha,
mais alegria,
mais sentido de viver e não se sobreviver,
mais objectivos pessoais,
mais independência e espírito de iniciativa.
Gostaria de ter ouvido, sem te pedir, o quanto era importante na tua vida, o quanto eu te fazia feliz, as qualidades que mais apreciavas em mim e não tanto os defeitos que tão bem e de sobra conheço.
Gostaria de ter sabido em que momento percebeste que me amavas e porquê. Também gostava de saber porque nunca mo quiseste contar.
Teria adorado receber uma flor, ou outra coisa romântica fora das datas convencionais. Uma vez disseste-me que não gostavas de oferecer presentes nas datas festivas. Simplesmente tu não gostavas de oferecer. E por isso nunca o fizeste fora das datas festivas. O que mais me magoa é que até eu perdi o gosto de oferecer, quando o fazia no início sempre que me apetecia. Há quanto tempo não te ofereço nada?
Também queria que tivesses aprendido comigo a comunicar, a transmitir sentimentos. Os beijos e carícias não se trocam apenas na cama nem são meros gestos de cumprimento ou despedida.
E as palavras têm muito peso. Foi um grande erro meu convencer-me do contrário. Elas existem carregadas de significado e devem ser usadas. Eu sou palavra, trabalho com a palavra, divirto-me e passo tempo livre a brincar com ela. A sua importância na minha vida é incondicional. Omitir palavras, escondê-las é negar parte de mim. Cansei-me de esperar pelo “amo-te” e pelo “gosto muito de ti” e mais ainda pelo “estou a teu lado, podes contar comigo sempre”. Compreendo e não condeno as tuas dificuldades de expressão, mas há palavras que, ditas no momento certo, ajudam a aliviar tristezas, a ultrapassar medos e inseguranças. Combatem a solidão. Quando precisei não as tive. E, no entanto, agora elas surgem na tua boca no vão intento de remediar algo que não tem cura. Porque não surgiram antes? Das raras vezes que, em todo este tempo, foram pronunciadas, soaram-me de forma artificial.
Quero ser mãe. Quero partilhar a maternidade com alguém que esteja disposto a sacrificar-se pela família. Quero acreditar que essa pessoa vai estar presente de espírito e corpo nos momentos cruciais.
Não quero promessas de que as coisas vão ser diferentes, pois já não creio nelas. Se tivessem de ser diferentes já teriam sido diferentes.
Os nossos mundos são distintos e tendem a distanciar-se cada vez mais. Não me parece que seja apenas eu a senti-lo. Fingir que não se vê, não se compreende, evitar a realidade, não é solução, apenas um adiamento do problema. Entende que os nossos caminhos se cruzaram para aprendermos um com o outro. Mas esse tempo de aprendizagem terminou e é hora de vivermos novas vidas. Quanto mais depressa, melhor.